segunda-feira, 2 de julho de 2012

O Mundo Invisível

 

 

Terceira ParteO Mundo Invisível

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A Natureza e a Ciência

Expusemos, nas páginas precedentes, os princípios essenciais da filosofia das existências sucessivas. Apoiados sobre a mais rigorosa lógica, tais princípios esclarecem o nosso futuro e resolvem numerosos problemas até aqui não explicados.
Entretanto, podem objetar-nos que essas doutrinas, por mais lógicas e racionais que pareçam, não passam de simples hipóteses, meras especulações, e que como tais devem ser tratadas.
A nossa época, fatigada dos devaneios da imaginação, das teorias e dos sistemas preconcebidos, propendeu para o cepticismo. Diante de qualquer afirmação reclama provas. Não lhe basta o mais lógico raciocínio. Precisa de fatos sensíveis, diretamente observados, para dissipar as suas dúvidas. Tais dúvidas se explicam: são a conseqüência fatal do abuso das lendas, das ficções, das doutrinas errôneas com que durante séculos se embalou a Humanidade. De crédulo que era, o homem, instruindo-se, tornou-se céptico e cada teoria nova é acolhida com desconfiança, senão com hostilidade.
Não nos lastimemos desse estado de espírito, que não é, em suma, senão homenagem inconsciente prestada à verdade pelo pensamento humano. Com isso, a filosofia das existências sucessivas só tem a ganhar, porque, longe de ser mais um sistema fantasista, apóia-se num conjunto imponente de fatos, estabelecidos por provas experimentais e por testemunhos universais. A tais fatos é que consagraremos a terceira parte desta obra.
O progresso da Ciência, em suas escalas inumeráveis, é comparável a uma ascensão em país de altas montanhas. À medida que o viajante galga as árduas encostas, o horizonte se lhe alarga, os pormenores do plano inferior se confundem em vasto conjunto, enquanto novas perspectivas se desvendam ao longe. Quanto mais sobe, tanto maior amplidão e majestade adquire o espetáculo. Assim a Ciência, em seu progresso incessante, descobre, a cada passo, domínios ignorados.
Todos sabem quão limitados são os nossos sentidos materiais, como é restrito o campo que estes abraçam. Além das cores e dos raios percebidos por nossa vista, há outras cores, outros raios, cuja existência é demonstrada pelas reações químicas. Do mesmo modo, o ouvido só percebe as ondas sonoras entre dois extremos, além dos quais as vibrações sonoras, muito agudas ou muito graves, nenhuma influência exercem sobre o nervo auditivo.
Se a nossa força visual não tivesse sido aumentada pelas descobertas da óptica, que saberíamos do Universo na hora presente? Não só ignoraríamos a existência dos longínquos impérios do éter, onde sóis sucedem a sóis, onde a matéria cósmica, em suas eternas gestações, faz surgir astros por milhares, como também nada saberíamos ainda dos mundos mais vizinhos à Terra.
Gradualmente e de idade em idade, tem-se estendido o campo de observação. Graças à invenção do telescópio, o homem tem podido explorar os céus e comparar o nosso mesquinho globo com as esferas gigantescas do espaço.
Mais recentemente, a invenção do microscópio abriu-nos um outro infinito. Por toda parte, em torno de nós, nos ares, nas águas, invisíveis a nossos fracos olhos, miríades de seres pululam e agitam-se em turbilhões espantosos. Tornou-se possível o estudo da constituição molecular dos corpos. Chegou-se a reconhecer que os glóbulos do sangue, os tecidos e as células do corpo humano são povoados de parasitas animados, de infusórios, em detrimento dos quais vivem ainda outros parasitas. Ninguém pode dizer onde termina o fluxo da vida!
A Ciência progride, engrandece-se, e o pensamento por ela alentado sobe a novos horizontes. Mas quão leve se apresenta a bagagem dos nossos conhecimentos, quando a comparamos com o que nos resta ainda aprender! O Espírito humano tem limites, a Natureza não. “Com o que ignoramos das leis universais – diz Faraday – poder-se-ia criar o mundo.” Os nossos sentidos grosseiros permitem que vivamos no meio de um oceano de maravilhas, sem mesmo suspeitarmos delas, como cegos banhados em catadupas de luz.


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Matéria e Força - Princípio Único das Coisas

Até aqui a matéria só era conhecida sob os três estados: sólido, líquido e gasoso. Crookes, o sábio físico inglês, procurando fazer o vácuo em tubos de vidro, descobriu um quarto estado, a que chamou radiante. Os átomos, restituídos à liberdade pela rarefação, entregam-se, nesse vácuo relativo, a movimentos vibratórios de uma rapidez, de uma violência incalculáveis. Inflamam-se e produzem efeitos de luz, radiações elétricas que permitem explicar a maior parte dos fenômenos cósmicos.
Condensada em graus diversos sob seus primeiros aspectos, a matéria perde, no estado radiante, várias propriedades: densidade, forma, cor, peso; mas, neste novo domínio, parece estar, de maneira muito mais íntima, unida à força. Este quarto estado será o último que a matéria pode revestir? Não, sem dúvida, porque podemos imaginar muitos outros ou entrever pelo pensamento um estado fluídico e sutil, tão superior ao radiante quanto este ao gasoso, e o estado líquido ao sólido. A Ciência do futuro, explorando essas profundezas, encontrará a solução dos problemas maravilhosos da unidade de substância e das forças diretoras do Universo.
A unidade de substância já é prevista, admitida pela maior parte dos sábios. A matéria, nós o dissemos, parece ser, em seu princípio, um fluido de sutileza, de elasticidade infinitas, cujas inumeráveis combinações dão origem a todos os corpos. Invisível, imperceptível, impalpável, esse fluido, em sua essência primordial, torna-se, por transições sucessivas, ponderável e chega a produzir, por condensação poderosa, os corpos duros, opacos e pesados que constituem o caráter da matéria terrestre. Essa condensação é, porém, transitória e a matéria, tornando a subir a escala de suas transformações, facilmente se desagregará e voltará ao seu estado fluídico primitivo. Eis por que a existência dos mundos é passageira. Saídos dos oceanos do éter, aí tornam a mergulhar e a dissolver-se, depois de percorrido o seu ciclo de vida. Pode-se afirmar que, na Natureza, tudo converge para a unidade. A análise espectral revela a identidade dos elementos constitutivos do Universo, desde o mais humilde satélite até o sol mais gigantesco. O deslocamento dos corpos celestes mostra a unidade das leis mecânicas. O estudo dos fenômenos materiais, como uma cadeia infinita, conduz-nos, gradativamente, à concepção de uma substância única, etérea, universal, e de uma força igualmente única, princípio de movimento, da qual a eletricidade, a luz e o calor não são mais que variedades, modalidades, formas diversas.[i]
É assim que, em sua marcha paralela, a Química, a Física e a Mecânica verificam cada vez mais a coordenação misteriosa das coisas. O Espírito humano encaminha-se com lentidão, algumas vezes mesmo inconscientemente, para o conhecimento de um princípio único fundamental, em que se unam a substância, a força e o pensamento, de uma potência cuja grandeza e majestade o encherão algum dia de surpresa e admiração.


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Os Fluidos - O Magnetismo

Esse mundo dos fluidos, que se entrevê além do estado radiante, reserva bastantes surpresas e descobertas à Ciência. Inumeráveis são as variedades de formas que a matéria, tornando-se sutil, pode revestir para as necessidades de uma vida superior.
Já muitos observadores sabem que, fora das nossas percepções, além do véu opaco que nossa espessa constituição apresenta, existe um outro mundo, não mais o dos infinitamente pequenos, porém um Universo fluídico completamente povoado de multidões invisíveis.
Seres sobre-humanos, mas não sobrenaturais, vivem junto de nós, testemunhas mudas dos nossos atos, e só manifestando a sua existência em condições determinadas, sob a ação de leis naturais, exatas, rigorosas. Importa penetrar o segredo dessas leis, porque de seu conhecimento decorrerá para o homem a posse de forças consideráveis, cuja utilização prática pode transformar a face da Terra e a ordem das sociedades. É esse o domínio da Psicologia experimental; outros diriam o das ciências ocultas.
Essas ciências são tão velhas quanto o mundo. Já falamos dos prodígios efetuados nos lugares sagrados da Índia, do Egito e da Grécia. Não está em nosso programa nos estendermos demasiado sobre esta ordem de fatos, mas há uma questão conexa que não devemos deixar passar em silêncio: é a do Magnetismo.
O Magnetismo, estudado e praticado secretamente em todas as épocas da História, vulgarizou-se sobretudo nos fins do século XVIII. As academias ainda o encaram como suspeito, e foi sob o novo nome de Hipnotismo que os mestres da Ciência resolveram-se a admiti-lo, um século depois do seu aparecimento.
“O Hipnotismo, diz o Sr. de Rochas,[ii] até hoje estudado só oficialmente, não é senão o vestíbulo de vasto e maravilhoso edifício, já em grande parte explorado pelos antigos investigadores.”
Infelizmente, os sábios oficiais – quase todos médicos – que se ocupam do Magnetismo ou, como eles próprios o dizem, de Hipnotismo, só fazem as suas experiências, geralmente, sobre passivos doentes, sobre internos de hospitais. A irritação nervosa e as afecções mórbidas desses passivos só permitem obter fenômenos incoerentes, incompletos. Certos sábios parecem recear que o estudo desses mesmos fenômenos, obtidos em condições normais, forneça a prova da existência do princípio anímico no homem. É pelo menos o que resulta dos comentários do Dr. Charcot, cuja competência ninguém certamente negará.
“O Hipnotismo, diz ele, é um mundo no qual se encontram fatos palpáveis, materiais, grosseiros, que acompanham sempre a Psicologia, ao lado de outros fatos absolutamente extraordinários, inexplicáveis até hoje, que não correspondem a nenhuma lei fisiológica, e inteiramente estranhos, surpreendentes. Ocupo-me dos primeiros e deixo de lado os segundos.”
Assim, os mais célebres médicos confessam que essa questão ainda está para eles cheia de obscuridade. Em suas pesquisas, limitam-se a observações superficiais, desdenhando os fatos que poderiam conduzi-los diretamente à solução do problema. A ciência materialista hesita em aventurar-se no terreno da Psicologia experimental, pois sente que ali se acharia em presença das forças psíquicas, da alma enfim, cuja existência tem negado com tanta tenacidade.
Seja como for, o Magnetismo, repelido pelas corporações sábias, começa sob outro nome a atrair-lhes a atenção. Os resultados seriam, porém, muito mais fecundos se, ao invés de operarem sobre histéricos, experimentassem sobre indivíduos sãos e válidos. O sono magnético desenvolve, nos passivos lúcidos, faculdades novas, um poder incalculável de percepção. O mais notável fenômeno é a visão a grande distância, sem o auxílio dos olhos. Um sonâmbulo pode orientar-se durante a noite, ler e escrever com os olhos fechados, entregar-se aos mais delicados e complicados trabalhos. Outros vêem no interior do corpo humano, discernem seus males e causas, lêem o pensamento no cérebro,[iii] penetram, sem o concurso dos sentidos, nos mais recônditos domínios e até no vestíbulo do outro mundo. Sondam os mistérios da vida fluídica, entram em relação com os seres invisíveis, transmitem-nos seus conselhos, seus ensinos. Mais adiante voltaremos a este ponto, porém desde já podemos considerar como estabelecido o fato que decorre dos estudos, das experiências de Puységur, Deleuze, du Potet e de seus inumeráveis discípulos, isto é, que o sono magnético, imobilizando o corpo, aniquilando os sentidos, restitui à liberdade o ser psíquico, centuplica-lhe os meios íntimos de percepção e o faz entrar num mundo vedado aos seres corpóreos, mundo cujas belezas e leis nos descreve.
E esse ser psíquico que, no sono, vive, pensa, age fora do corpo, que afirma sua personalidade independente por um modo especial de apreciação, por conhecimentos superiores aos que possuía no estado de vigília, que será senão a própria alma, não mais uma resultante das forças vitais dos órgãos, porém uma causa livre, uma vontade ativa, desprendida momentaneamente de sua prisão, pairando sobre a natureza inteira e gozando a integridade de suas faculdades inatas?
Assim, pois, os fenômenos magnéticos tornam evidente não só a existência da alma, mas também a sua imortalidade; porque, se, durante a existência corpórea, essa alma se desliga do seu grosseiro invólucro, vive e pensa fora dele, com mais forte razão achará na morte a plenitude de uma liberdade.
A ciência do Magnetismo não só nos leva a crer na existência da alma, mas também nos dá a posse de maravilhosos recursos. A ação dos fluidos sobre o corpo humano é considerável; suas propriedades são múltiplas, variadas. Fatos numerosos têm provado que, com o seu auxílio, se podem aliviar os sofrimentos mais cruéis. Os grandes missionários não curavam pela aposição das mãos? Eis todo o segredo dos seus supostos milagres. Os fluidos, obedecendo a uma poderosa vontade, a um ardente desejo de fazer o bem, penetram os organismos debilitados e suas moléculas benéficas, substituindo as que estão doentes, restituem gradualmente a saúde aos enfermos, o vigor aos valetudinários.
Objetam que uma legião de charlatães, para explorar o Magnetismo, abusa da credulidade e da ignorância do público, exornando-se com um poder imaginário. Mas, isso é uma conseqüência inevitável do estado de inferioridade moral da Humanidade.
Uma coisa nos consola desses fatos contristadores: é a certeza de que todo homem animado de simpatia profunda pelos deserdados, de verdadeiro amor pelos que sofrem, pode aliviar seus semelhantes por uma prática sincera e esclarecida do Magnetismo.
Livro: Depois da morte: Léon Denis
Fonte: www.autoresespiritasclassicos.com


[i]    Eis o que diz Berthelot (Origines de la Chimie, pág. 320): “Da mesma forma que os quatro elementos dos antigos, os fluidos elétrico, magnético, calorífero e luminoso, que se admitiam há meio século, já hoje, em sua substância, não oferecem base de discriminação, pois está reconhecido, pelos progressos da Ciência, que todos eles se reduzem a um só elemento: o éter. Entretanto, o éter dos físicos e o átomo dos químicos também a seu turno são decomponíveis para darem lugar a concepções mais elevadas, que tendem a explicar tudo somente pelos fenômenos do movimento.” Segundo G. Le Bon (L’Evolution de la Matiére; L’Evolution des Forces), a matéria e a força mais não são que dois aspectos da mesma substância. A matéria é a força condensada; a força, a matéria dissociada.
[ii]   Les États Profonds de l’Hypnose, pelo Coronel de Rochas, pág. 75.
[iii]   O sujet vê as células cerebrais vibrarem sob a influência do pensamento e compara-as a estrelas que se dilatam e se contraem sucessivamente. (Les Ëtats Profonds de l’Hypnose pelo Coronel de Rochas, diretor da Escola Politécnica de Paris.) A respeito, o professor Th. Flournoy, da Universidade de Genêve, escrevia: “Basta consultar a literatura médica mais recente para encontrar, sob a pena de autores insuspeitos de misticismo, exemplos de vista interna. De uma parte, temos psiquiatras franceses que acabam de publicar alguns casos de alienados que apresentaram, poucos dias antes de seu fim, um melhoramento tão súbito quão inexplicável, ao mesmo tempo em que o pressentimento de sua morte próxima. De outra parte, há o caso de sonâmbulos que têm a visão clara de suas vísceras, às vezes abrangendo mesmo a sua estrutura íntima; este fato vem, pela primeira vez, transpor os limites da Ciência sob o nome de autoscopia interna ou auto-representação do organismo. E, por uma divertida ironia da sorte, essa novidade vem apoiada por aqueles que se reconhecem defensores de uma escola que pretende rejeitar toda explicação psicológica desses fatos.” (Archives de Psychologie, agosto, 1903.)

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