sexta-feira, 31 de agosto de 2012

Os problemas da existência

 

 

Os problemas da existência...

    O que importa ao homem saber, acima de tudo, é: o que ele é, de onde vem, para onde vai, qual o seu destino. As idéias que fazemos do universo e de suas leis, da função que cada um deve exercer sobre este vasto teatro, são de uma importância capital. Por elas dirigimos nossos atos. Consultando-as, estabelecemos um objetivo em nossas vidas e para ele caminhamos. Nisso está a base, o que verdadeiramente motiva toda civilização. Tão superficial é seu ideal, quanto superficial é o homem. Para as coletividades, como para o indivíduo, é a concepção do mundo e da vida que determina os deveres, fixa o caminho a seguir e as resoluções a adotar.
    Mas, como dissemos, a dificuldade em resolver esses problemas, muito freqüentemente, nos faz rejeitá-los. A opinião da grande maioria é vacilante e indecisa, seus atos e caracteres disso sofrem a conseqüência. É o mal da época, a causa da perturbação à qual se mantém presa. Tem-se o instinto do progresso, pode-se caminhar mas, para chegar aonde? É nisto que não se pensa o bastante. O homem, ignorante de seus destinos, é semelhante a um viajante que percorre maquinalmente um caminho sem conhecer o ponto de partida nem o de chegada, sem saber porque viaja e que, por conseguinte, está sempre disposto a parar ao menor obstáculo, perdendo tempo e descuidando-se do objetivo a atingir.
    A insuficiência e obscuridade das doutrinas religiosas e os abusos que têm engendrado, lançam numerosos espíritos ao materialismo. Crê-se, voluntariamente, que tudo acaba com a morte, que o homem não tem outro destino senão o de se esvanecer no nada.
    Demonstraremos a seguir como esta maneira de ver está em oposição flagrante à experiência e à razão. Digamos, desde já, que está destituída de toda noção de justiça e progresso.
    Se a vida estivesse circunscrita ao período que vai do berço à tumba, se as perspectivas da imortalidade não viessem esclarecer sua existência, o homem não teria outra lei senão a de seus instintos, apetites e gozos. Pouco importaria que amasse o bem e a eqüidade. Se não faz senão aparecer e desaparecer nesse mundo, se traz consigo o esquecimento de suas esperanças e afeições, sofreria tanto mais quanto mais puras e mais elevadas fossem suas aspirações; amando a justiça, soldado do direito, acreditar-se-ia condenado a quase nunca ver sua realização; apaixonado pelo progresso, sensível aos males de seus semelhantes, imaginaria que se extinguiria antes de ver triunfarem seus princípios.
    Com a perspectiva do nada, quanto mais tivesse praticado o devotamento e a justiça, mais sua vida seria fértil em amarguras e decepções. O egoísmo, bem compreendido, seria a suprema sabedoria; a existência perderia toda sua grandeza e dignidade. As mais nobres faculdades e as mais generosas tendências do espírito humano terminariam por se dobrar e extinguir inteiramente.
    A negação da vida futura suprime também toda sanção moral. Com ela, quer sejam bons ou maus, criminosos ou sublimes, todos os atos levariam aos mesmos resultados. Não haveria compensações às existências miseráveis, à obscuridade, à opressão, à dor; não haveria consolação nas provas, esperança para os aflitos. Nenhuma diferença se poderia esperar, no porvir, entre o egoísta, que viveu somente para si, e freqüentemente na dependência de seus semelhantes, e o mártir ou o apóstolo que sofreu, que sucumbiu em combate para a emancipação e o progresso da raça humana. A mesma treva lhes serviria de mortalha.
    Se tudo terminasse com a morte o ser não teria nenhuma razão de se constranger, de conter seus instintos e seus gostos. Fora das leis terrestres, ninguém o poderia deter. O bem e o mal, o justo e o injusto se confundiriam igualmente e se misturariam no nada. E o suicídio seria sempre um meio de escapar aos rigores das leis humanas.
    A crença no nada, ao mesmo tempo em que arruína toda sanção moral, deixa sem solução o problema da desigualdade das existências, naquilo que toca à diversidade das faculdades, das aptidões, das situações e dos méritos. Com efeito, por que a uns todos os dons de espírito e do coração e os favores da fortuna, enquanto que tantos outros não têm compartilhado senão a pobreza intelectual, os vícios e a miséria? Por que, na mesma família, parentes e irmãos, saídos da mesma carne e do mesmo sangue, diferem essencialmente sobre tantos pontos? Tantas questões insolúveis para os materialistas e que podem ser respondidas tão bem pelos crentes. Essas questões, nós iremos examinar brevemente à luz da razão.


Léon Denis

O Porquê da Vida

Harmonia do universo

 

 


IV

Harmonia do universo
    Vimos acima a existência em nós de um princípio inteligente e racional; retornamos agora até a fonte de onde decorre para explicar sua origem pelo encadeamento das causas e dos efeitos. Os homens chamam essa fonte, na sua pobre e insuficiente linguagem, de Deus.
    Deus é o centro de onde emanam e para onde retornam todas as potências do Universo. Ele é o foco de onde se irradia toda idéia de justiça, solidariedade e amor; o objetivo comum para o qual todos os seres se encaminham, consciente ou inconscientemente. É de nosso relacionamento com o grande Arquiteto dos mundos que decorrem a harmonia universal, a comunidade e a fraternidade. Para sermos irmãos, com efeito, é preciso haver um pai comum, e esse pai somente pode ser Deus.
    Deus, dirá você, tem estado presente sob aspectos tão estranhos, por vezes tão revoltantes para os homens crentes, que o espírito moderno se está afastando d’Ele. Mas que importam essas divagações sectárias? Pretender que Deus possa ser diminuído pelos propósitos dos homens equivale a dizer que o monte Branco e o Himalaia possam ser manchados pelo sopro de um mosquito. A verdade paira radiosa, deslumbrante, bem acima das obscuridades teológicas.
    Para entrever esta verdade, o pensamento deve se desligar das regras estreitas, das práticas vulgares, rejeitar as formas pueris com as quais certas religiões têm envolvido o supremo ideal. Deve estudar Deus na majestade de suas obras.
    Na hora em que tudo repousa nas nossas cidades, quando a noite está transparente e o silêncio se faz sobre a terra adormecida, então, ó homens, meus irmãos, elevem seus olhos e contemplem o infinito dos céus!
    Observem a marcha ritmada dos astros, evoluindo nas profundezas. Esses fogos inumeráveis são mundos perto dos quais a Terra não é mais que um átomo, sóis prodigiosos contornados por cortejos de esferas e dos quais as distâncias espantosas que nos separam se medem por milhões de anos-luz. Por isso nos parecem simples pontos luminosos. Mas, dirijam para eles esse olho colossal da ciência, o radiotelescópio, e vocês distinguirão suas superfícies, semelhantes a oceanos em chamas.
    Procurem em vão contá-los; eles se multiplicam até nas regiões mais remotas e confundem-se na distância, como uma poeira luminosa. Observem também, como sobre os mundos vizinhos da Terra se desenham os vales e as montanhas, mares são cavados, nuvens se movem. Reconheçam que as manifestações da vida se produzem por toda parte, e que uma ordem admirável une, sob leis uniformes e por destinos comuns, a Terra e seus irmãos, os planetas errantes no infinito. Verifiquem que todos esses mundos, habitados por outras sociedades humanas, se agitam, se afastam e aproximam dotados de velocidades diversas, percorrendo orbes imensos; por todo lado o movimento, a atividade e a vida se mostram em um espetáculo grandioso. Observem nosso próprio globo, a Terra, que parece nos dizer:”Vossa carne é a minha, vossos entes minhas crianças”. Observem-na, esta grande ama de leite da humanidade; vejam a harmonia de seus contornos, seus continentes, no seio dos quais as nações germinam e crescem, seus vastos oceanos sempre em movimento; acompanhem a renovação das estações revestindo-a, cada vez, de verdes adornos ou de louras colheitas; contemplem os seres vivos que a povoam: pássaros, insetos, plantas e flores; cada um deles é um cinzelado maravilhoso, uma jóia do estojo divino. Observem a si mesmos; vejam o desempenho admirável de seus órgãos, o mecanismo maravilhoso e complicado de seus sentidos. Que gênio humano poderia imitar essas delicadas obras-primas?
    Considerem todas essas coisas e perguntem à sua razão se tanta beleza, esplendor e harmonia, podem resultar do acaso, ou se não existe, sobretudo, uma causa inteligente presidindo a ordem do mundo e a evolução da vida. E se vocês me opusessem os flagelos, as catástrofes, tudo o que vem perturbar essa ordem admirável, lhes responderia: Sondem os problemas da natureza, não se fixem na superfície, desçam ao fundo das coisas e descobrirão, com surpresa, que as aparentes contradições mais não fazem que confirmar a harmonia geral, que são úteis ao progresso dos seres, único propósito da existência.
    Se Deus fez o mundo, replicam triunfalmente certos materialistas, quem então fez Deus? Esta objeção não tem sentido. Deus não é um ser que se junte à série dos seres. Ele é o Ser universal, sem limites no tempo e no espaço, por conseqüência infinito, eterno. Não pode haver nenhum ser acima nem ao lado dele. Deus é a fonte e o princípio de toda vida. É por ele que se religam, unem e harmonizam todas as forças individuais, e que sem Ele estariam isoladas e divergentes.
    Abandonadas a si mesmas, não estando regidas por uma lei, uma vontade superior, essas forças não teriam produzido senão confusão e caos. O fato de existir um plano geral, um propósito comum, do qual participem todas as potências do universo, prova a existência de uma causa, uma inteligência suprema, que é Deus.


Léon Denis

O Porquê da Vida

quinta-feira, 9 de agosto de 2012

Livro sagrado

                        Livro sagrado...
No meu modo de pensar, todos os livros que ensina, e da instrução para o bem são sagrados como os livros das escolas educacionais, das universidades; Das religiões tivemos: (Tao Ciao) surgiu na dinastia do imperador Han, no século II. Tchuang-tseu, um discípulo de Lao Tsé e filósofo chinês, que morreu no princípio do século III, desenvolveram e proliferaram os ensinamentos de seu mestre. Tchuang-tseu escreveu uma média de 33 livros sobre a filosofia de Lao-Tsé, que resultou na composição de 1.120 volumes, os quais formam o Cânon Taoísta. Ele acreditava que o “Tao-te-Ching” era a fonte da sabedoria e a solução para todos os problemas da vida.
Este último aspecto é muito importante. Consta que Tales desafiava aqueles que conheciam as suas idéias a demonstrar que não tinha razão. Esta é uma característica da ciência — e da filosofia — que se opõe ao mito e à religião. A vontade de discutir racionalmente idéias, ao invés de nos limitarmos a aceitá-las, é um elemento sem o qual a ciência não se poderia ter desenvolvido. Uma das vantagens da discussão aberta de idéias é que os defeitos das nossas idéias são criticamente examinados e trazidos à luz do dia por outras pessoas. Foi talvez por isso que outros pensadores da mesma região surgiram apresentando diferentes teorias e, deste modo, se iniciou uma tradição que se foi gradualmente afastando das concepções míticas anteriores. Assim apareceram na Grécia, entre outros, Anaximandro (séc. VI a. C.), Heraclito (séc. VI/V a. C.), Pitágoras (séc. VI a. C.), Parmênides de Eléia (cerca de 530 a.C. - 460 a.C.) nasceu em Eléia, hoje Vélia, Itália. Foi o fundador da escola eleática. Há uma tradição que afirma ter sido Parmênides o discípulo de Xenófanes de Cólofon, mas não há certeza sobre o fato, já que uma tradição distinta afirma ter sido o filósofo pitagórico Amínias (ou Ameinias) quem despertou a vocação filosófica de Parmênides.
 (séc. VI/V a. C.) e Demócrito (séc. V/IV a. C.). Este último viria mesmo a defender que tudo quanto existia era composto de pequeníssimas partículas indivisíveis (átomos), unidas entre si de diferentes formas, e que na realidade nada mais havia do que átomos e o vazio onde eles se deslocavam. Foi o primeiro grande filósofo naturalista, que achava que não havia deuses e que a natureza tinha as suas próprias leis...
 Hermes Trismegistos considerado o inventor da escrita e de todas as ciências a ela ligadas, inclusive a medicina, a astronomia e a magia. Segundo o historiador Heródoto, já no séc. V a.C.
O Livro dos Mortos data da época do Império Novo, período da história do Antigo Egito que se inicia por volta de 1580 a.C. e termina em 1160 a.C.. No entanto, a obra recolhe textos mais antigos - do Livro das Pirâmides (Império Antigo) e do Livro dos Sarcófagos (Império Médio).
As edições modernas do Livro dos Mortos são compostas por cerca 200 "capítulos", nome que os egiptólogos dão às fórmulas encontradas nos papiros preservados ao longo dos séculos. Nenhum dos papiros conhecidos apresenta o mesmo número de capítulos e de ilustrações... Foi na Grécia Antiga, na cidade de Olímpia. Os gregos também desenvolveram uma rica mitologia. Até os dias de hoje a mitologia grega é referência para estudos e livros. A filosofia também atingiu um desenvolvimento surpreendente, principalmente em Atenas, no século V (Período Clássico da Grécia) Platão e Sócrates são os filósofos mais conhecidos deste período...
Há cerca de 3 500 anos, as comunidades na região do vale do Indo, atual norte da Índia, começaram a organizar um dos sistemas religiosos o hinduísmo. Suas crenças foram transmitidas oralmente de geração em geração por muitos séculos até serem transcritas nos Vedas, compilação de hinos e preces considerada como o primeiro livro sagrado da história. O conteúdo dessa literatura sagrada, composta de 4 volumes de texto em versos, explica ao mesmo tempo a unidade e a variedade das múltiplas correntes do hinduísmo.
O Talmude é uma compilação, que data de 499 d.C., de leis e tradições judaicas, consistindo-se em 63 (sessenta e três) tratados de assuntos legais, éticos e históricos.
A Bíblia é formada por livros. São 73 os livros contidos na Bíblia. Desses 73 livros, 46 constituem o conjunto de livros do Antigo Testamento e 27 constituem o conjunto dos livros do Novo Testamento e Antigo Testamento a palavra testamento significa aliança.
A Bíblia (que o nome quer dizer simplesmente O Livro) é na verdade uma biblioteca, reunindo os livros diversos da religião hebraica. Representa a codificação da primeira revelação do ciclo do Cristianismo.
Livros escritos por vários autores, todos escritos em hebraico e aramaico e traduzidos mais tarde para o latim, por São Jerônimo, na conhecida Vulgata Latina, no século quinto da nossa era. As igrejas católicas e protestantes reuniram a esse livro os Evangelhos de Jesus, dando a estes o nome geral de Novo Testamento.
O Evangelho, como se costuma designar o Novo Testamento, não pertence, de fato, à Bíblia. É outro livro, escrito muito mais tarde, com a reunião dos vários escritos sobre Jesus e seus ensinos. O Evangelho é a codificação da segunda revelação cristã. Traz uma nova mensagem, substituindo o deus-guerreiro da Bíblia pelo deus-amor do Sermão da Montanha. No Espiritismo não devemos confundir esses dois livros, mas devemos reconhecer a linha histórica e profética, a linhagem espiritual que os liga. São, portanto, dois livros distintos.
A expressão “a palavra de Deus” é de origem judaica. Foi naturalmente herdada pelo Cristianismo, que a empregou para o mesmo fim dos judeus: dar autoridade à Igreja. A Bíblia, considerada “a palavra de Deus”, reveste-se de um poder mágico: a sua simples leitura, ou simplesmente a audiência dessa leitura, pode espantar o Demônio de uma pessoa e convertê-la a Deus. Claro que o Espiritismo não aceita nem prega essa velha crendice, mas não a condena. A cada um, segundo suas convicções, desde que haja boa intenção
O Espiritismo reconhece a ação de Deus na Bíblia, mas não pode admiti-la como “a palavra de Deus”. Na verdade, como ensinou o apóstolo Paulo, foram os mensageiros de Deus, os Espíritos, que guiaram o povo de Israel, através dos médiuns, então chamados profetas. O próprio Moisés era um médium, em constante ligação com Iave ou Jeová, o deus bíblico, violento e irascível, tão diferente do deus-pai do Evangelho.
Devemos respeitar a Bíblia no seu exato valor, mas nunca fazer dela um mito, um novo bezerro de ouro. Deus não ditou nem dita livros aos homens. Somente às religiões dogmáticas, que se apresentam como vias exclusivas de salvação, interessam o velho conceito da Bíblia como palavra de Deus. Primeiro, porque esse conceito impede a investigação livre. Considerada como palavra de Deus, a Bíblia é indiscutível, deve ser aceita literalmente ou de acordo com a “interpretação autorizada da igreja”. Por isso, as igrejas sempre se apresentam como “autoridade única na interpretação da Bíblia”. Segundo, porque essa posição corresponde aos tempos mitológicos, ao pensamento mágico, e não à era de razão em que vivemos.
Se começares bem nas diretrizes organizadas por Jesus e postas em cima da mesa por Kardec, formar-se-á em tua consciência um senso que te permitirá escolher as melhores orientações para as tuas reformas morais e para as tuas mudanças de hábitos. Certamente que somos influenciados pelo meio em que vivemos. No entanto pela nossa disposição poderemos mudar os nossos destinos, de modo a suavizar os nossos fardos e amenizar o nosso jugo. Depende da nossa determinação.
"Não sabemos senão em razão da nossa faculdade de recepção”... Pitágoras
Fiquem com nosso irmão maior Jesus muita paz...

terça-feira, 7 de agosto de 2012

Emancipação da alma




O sonho e os sonhos
400. O Espírito encarnado permanece de bom grado no seu envoltório corporal?
“É como se perguntasses se ao encarcerado agrada o cárcere. O Espírito encarnado aspira constantemente à sua libertação e tanto mais deseja ver-se livre do seu invólucro, quanto mais grosseiro é este.”
401. Durante o sono, a alma repousa como o corpo?
“Não, o Espírito jamais está inativo. Durante o sono, afrouxam-se os laços que o prendem ao corpo e, não precisando este então da sua presença, ele se lança pelo espaço e entra em relação mais direta com os outros Espíritos.”
402. Como podemos julgar da liberdade do Espírito durante o sono?
“Pelos sonhos. Quando o corpo repousa, acredita-o, têm o Espírito mais faculdades do que no estado de vigília.
Lembra-se do passado e algumas vezes prevêem o futuro.
Adquire maior potencialidade e pode pôr-se em comunicação com os demais Espíritos, quer deste mundo, quer do outro. Dizes freqüentemente: Tive um sonho extravagante, um sonho horrível, mas absolutamente inverossímil.
Enganas-te. É amiúde uma recordação dos lugares e das coisas que viste ou que verás em outra existência ou em outra ocasião. Estando entorpecido o corpo, o Espírito trata de quebrar seus grilhões e de investigar no passado ou no futuro.
Pobres homens, que mal conheceis os mais vulgares fenômenos da vida! Julgais-vos muito sábios e as coisas mais comezinhas vos confundem. Nada sabeis responder a estas perguntas que todas as crianças formulam: Que fazemos quando dormimos? Que são os sonhos?
O sono liberta a alma parcialmente do corpo. Quando dorme, o homem se acha por algum tempo no estado em que fica permanentemente depois que morre. Tiveram sonos inteligentes os Espíritos que, desencarnando, logo se desligam da matéria. Esses Espíritos, quando dormem, vão para junto dos seres que lhes são superiores. Com estes viajam, conversam e se instruem. Trabalham mesmo em obras que se lhes deparam concluídas, quando volvem, morrendo na Terra, ao mundo espiritual. Ainda esta circunstância é de molde a vos ensinar que não deveis temer a morte, pois que todos os dias morreis, como disse um santo.
Isto, pelo que concerne aos Espíritos elevados. Pelo que respeita ao grande número de homens que, morrendo, têm que passar longas horas na perturbação, na incerteza de que tantos já vos falaram esses vão, enquanto dormem, ou a mundos inferiores à Terra, onde os chamam velhas afeições, ou em busca de gozos quiçá mais baixos do que os em que aqui tanto se deleitam. Vão beber doutrinas ainda mais vis, mais ignóbeis, mais funestas do que as que professam entre vós. E o que gera a simpatia na Terra é o fato de sentir-se o homem, ao despertar, ligado pelo coração àqueles com quem acaba de passar oito ou nove horas de ventura ou de prazer. Também as antipatias invencíveis se explicam pelo fato de sentirmos em nosso íntimo que os entes com quem antipatizamos têm uma consciência diversa da nossa. Conhecemo-los sem nunca o termo visto. É ainda o que explica a indiferença de muitos homens.
Não cuidam de conquistar novos amigos, por saberem que muitos têm que os amam e lhes querem. Numa palavra: o sono influi mais do que supondes na vossa vida.
Graças ao sono, os Espíritos encarnados estão sempre em relação com o mundo dos Espíritos. Por isso é que os espíritos superiores assentem, sem grande repugnância, em encarnar entre vós. Quis Deus que, tendo de estar em contacto com o vício, pudessem eles ir retemperar-se na fonte do bem, a fim de igualmente não falirem, quando se propõem a instruir os outros. O sono é a porta que Deus lhes abriu, para que possam ir ter com seus amigos do céu; é o recreio depois do trabalho, enquanto esperam a grande libertação, a libertação final, que os restituirá ao meio que  lhes é próprio.
O sonho é a lembrança do que o Espírito viu durante o sono. Notai, porém, que nem sempre sonhais. Que quer isso dizer? Que nem sempre vos lembrais do que vistes, ou de tudo o que haveis visto, enquanto dormíeis. É que não tendes então a alma no pleno desenvolvimento de suas faculdades.
Muitas vezes, apenas vos fica a lembrança da perturbação que o vosso Espírito experimenta à sua partida ou no seu regresso, acrescida da que resulta do que fizestes ou do que vos preocupa quando despertos. A não ser assim, como explicaríeis os sonhos absurdos, que tanto os sábios, quanto as mais humildes e simples criaturas têm? Acontece também que os maus Espíritos se aproveitam dos sonhos para atormentar as almas fracas e pusilânimes.
Em suma, dentro em pouco vereis vulgarizar-se outra espécie de sonhos. Conquanto tão antiga como a de que vimos falando, vós a desconheceis. Refiro-me aos sonhos de Joana, ao de Jacob, aos dos profetas judeus e aos de alguns adivinhos indianos. São recordações guardadas por almas que se desprendem quase inteiramente do corpo, recordações dessa segunda vida a que ainda há pouco aludíamos.
Tratai de distinguir essas duas espécies de sonhos nos de que vos lembrais, do contrário cairíeis em contradições
e em erros funestos à vossa fé.”
Os sonhos são efeito da emancipação da alma, que mais independente se torna pela suspensão da vida ativa e de relação.
Daí uma espécie de clarividência indefinida que se alonga até aos mais afastados lugares e até mesmo a outros mundos. Daí também a lembrança que traz à memória acontecimentos da precedente existência ou das existências anteriores. As singulares imagens do que se passa ou se passou em mundos desconhecidos, entremeados de coisas do mundo atual, é que formam esses conjuntos estranhos e confusos, que nenhum sentido ou ligação parecem ter.
A incoerência dos sonhos ainda se explica pelas lacunas que apresenta a recordação incompleta que conservamos do que nos apareceu quando sonhávamos. É como se a uma narração se truncassem frases ou trechos ao acaso. Reunidos depois, os fragmentos restantes nenhuma significação racional teriam.
403. Por que não nos lembramos sempre dos sonhos?
“Em o que chamas sono, só há o repouso do corpo, visto que o Espírito está constantemente em atividade. Recobra, durante o sono, um pouco da sua liberdade e se corresponde com os que lhe são caros, quer neste mundo, quer em outros. Mas, como é pesada e grosseira a matéria que o compõe, o corpo dificilmente conserva as impressões que o espírito recebeu, porque a este não chegaram por intermédio dos órgãos corporais.”
404. Que se deve pensar das significações atribuídas aos sonhos?
“Os sonhos não são verdadeiros como o entendem os ledores de buena-dicha, pois fora absurdo crer-se que sonhar com tal coisa anuncia tal outra. São verdadeiros no sentido de que apresentam imagens que para o Espírito têm realidade, porém que, freqüentemente, nenhuma relação guardam com o que se passa na vida corporal. São também, como atrás dissemos, um pressentimento do futuro, permitido por Deus, ou a visão do que no momento ocorre em outro lugar a que a alma se transporta. Não se contam por muitos os casos de pessoas que em sonho aparecem a seus parentes e amigos, a fim de avisá-los do que a elas está acontecendo? Que são essas aparições senão as almas ou Espíritos de tais pessoas a se comunicarem com entes caros? Quando tendes certeza de que o que vistes realmente se deu, não fica provado que a imaginação nenhuma parte tomou na ocorrência, sobretudo se o que observastes não vos passava pela mente quando em vigília?”
405. Acontece com freqüência verem-se em sonho coisas que parecem um pressentimento, que, afinal, não se confirma. A que se deve atribuir isto?
“Pode suceder que tais pressentimentos venham a confirmar- se apenas para o Espírito. Quer dizer que este viu aquilo que desejava, foi ao seu encontro. É preciso não esquecer que, durante o sono, a alma está mais ou menos sob a influência da matéria e que, por conseguinte, nunca se liberta completamente de suas idéias terrenas, donde resulta que as preocupações do estado de vigília podem dar ao que se vê a aparência do que se deseja, ou do que se teme. A isto é que, em verdade, cabe chamar-se efeito da imaginação. Sempre que uma idéia nos preocupa fortemente, tudo o que vemos se nos mostra ligado a essa idéia.”
406. Quando em sonho vemos pessoas vivas, muito nossas conhecidas, a praticarem atos de que absolutamente não cogitam, não é isso puro efeito de imaginação?
“De que absolutamente não cogitam, dizes. Que sabes a tal respeito? Os Espíritos dessas pessoas vêm visitar o teu, como o teu os vai visitar, sem que saibas sempre o em que eles pensam. Demais, não é raro atribuirdes, de acordo com o que desejais, a pessoas que conheceis, o que se deu ou se está dando em outras existências.”
407. É necessário o sono completo para a emancipação do
Espírito?
“Não; basta que os sentidos entrem em torpor para que o Espírito recobre a sua liberdade. Para se emancipar, ele se aproveita de todos os instantes de trégua que o corpo lhe concede. Desde que haja prostração das forças vitais, o
Espírito se desprende, tornando-se tanto mais livre, quanto mais fraco for o corpo.”
Assim se explica que imagens idênticas às que vemos, em sonho, vejamos estando apenas meio dormindo, ou em simples modorra.
408. E qual a razão de ouvirmos, algumas vezes em nós mesmos, palavras pronunciadas distintamente e que nenhum nexo têm com o que nos preocupa?
“É fato: ouvis até mesmo frases inteiras, principalmente quando os sentidos começam a entorpecer-se. É, quase sempre, fraco eco do que diz um Espírito que convosco se quer comunicar.”
409. Doutras vezes, num estado que ainda não é bem o do adormecimento, estando com os olhos fechados, vemos imagens distintas, figuras cujas mínimas particularidades percebemos. Que há aí, efeito de visão ou de imaginação?
“Estando entorpecido o corpo, o Espírito trata de desprender- se. Transporta-se e vê. Se já fosse completo o sono, haveria sonho.”
O livro dos espíritos: Alan Kardec


quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Serena Luz: A BÍBLIA CONDENA O ESPIRITISMO?

Serena Luz: A BÍBLIA CONDENA O ESPIRITISMO?

Abusos da mediunidade

Na primeira ordem dos abusos que devemos assinalar, cumpre colocar as fraudes, as simulações.
As fraudes ou são conscientes e volitivas, ou inconscientes. Neste último caso são provocadas quer pela ação de Espíritos malfazejos, quer por sugestões sobre os médiuns exercidas pelos experimentadores e assistentes.
As fraudes conscientes provêm ora de falsos médiuns, ora de médiuns verdadeiros, mas pérfidos, que têm feito de sua faculdade uma fonte de proventos materiais. Desconhecendo a nobreza e a importância de sua missão, por natureza preciosa, eles a transformam num meio de exploração e não trepidam, quando falha o fenômeno, em o simular com artifícios.
Os falsos médiuns se encontram um pouco por toda parte. Uns não passam de péssimos farsistas que se divertem à custa do vulgacho e a si mesmos se traem cedo ou tarde. Outros há, industriosos, hábeis, para os quais o Espiritismo é apenas uma mercancia; esforçam-se por imitar as manifestações, tendo em mira o lucro a auferir. Muitos têm sido desmascarados em plena sessão; alguns já foram colhidos nas malhas de ruidosos processos. Nessa ordem de fatos, têm sido presenciadas as mais audaciosas falcatruas.[i] Certos indivíduos, abusando da boa-fé dos que os consultam, não têm hesitado em profanar os mais sagrados sentimentos e tornar suspeitas uma ciência e doutrinas que podem ser um meio de regeneração. Na maioria das vezes, são destituídos do sentimento de sua responsabilidade; mas na vida de além-túmulo bem desagradáveis surpresas lhes estão reservadas.
É incalculável o prejuízo por esses espertalhões causado à verdade. Com seus artifícios têm afastado muitos pensadores do estudo sério do Espiritismo. Por isso é dever de todo homem de bem desmascará-los, expô-los à merecida execração. O desprezo neste mundo, o remorso e a vergonha no outro – eis o que os espera. Porque, nós o sabemos, tudo se paga: o mal recai sempre sobre aquele que o pratica.
Não há coisa mais vil, mais desprezível, que bater moeda sobre as dores alheias, simular, a troco de dinheiro, os amigos, os entes caros que choramos, fazer da própria morte uma especulação desbriada, um objeto de falsificação.
O Espiritismo não pode ser responsabilizado por tais manejos. O abuso ou imitação de uma coisa nada pode fazer prejulgar contra a própria coisa. Não vemos freqüentemente imitados os fenômenos de Física pelos prestidigitadores? E que prova isso contra a verdadeira Ciência? Nada. O investigador inteligente deve estar precavido e fazer constante uso de sua razão. Se há alguns laboratórios em que, a pretexto de manifestações, se pratica um odioso tráfico, numerosos círculos existem, compostos de pessoas cujo caráter, posição e honorabilidade constituem outras tantas garantias de sinceridade, inacessíveis, em tais condições, a qualquer suspeita de charlatanismo.
*
Tem-se dado o fato – observemos – de certos médiuns, dotados de notáveis faculdades, não terem vacilado em misturar, nas sessões que realizam, as simulações com os fatos reais, visando aumentar os proventos ou a fama que desfrutam.
Perguntarão talvez por que anuem os desencarnados a prestar o seu concurso a indivíduos de tal sorte indignos. A resposta é fácil. Esses Espíritos, em seu vivo desejo de se manifestarem aos que na Terra amaram, encontrando em tais médiuns os elementos necessários para se materializarem, tornando-se visíveis, e, assim, demonstrarem a própria sobrevivência, não hesitam em utilizar os meios que se lhes oferecem, não obstante a indignidade dos intermediários.
Foi o que sucedeu em 1906, 1907 e 1908, no curso de sessões efetuadas em Paris por um médium estrangeiro, de que já falei no prefácio desta obra.
No dia 18 de junho de 1908, em casa do Sr. David, no Boulevard des Batignolles, estando sentado o médium fora do gabinete de materializações, à meia-luz, no círculo dos assistentes, foi visto formar-se um braço, que parecia surgir de um ângulo da sala. Descreveu um movimento circular e nos veio tocar a cabeça, a mim e ao reverendo Benezech, pastor protestante, sentado ao pé de mim. Do soalho saiu um fantasma vaporoso, que se ergueu à vista de todos, e uma voz se fez ouvir, proferindo um nome bem conhecido. Em seguida se foi abaixando e dissipou-se gradualmente no soalho. O médium, bem desperto, assinalava esses fenômenos, ao mesmo tempo em que se produziam em lugares da sala que não teria podido alcançar.
Na sessão de 12 de julho, em casa da Sra. Cornély, estava eu colocado à entrada do gabinete, em frente à abertura das cortinas. Um Espírito, com estatura de criança, desprezando essa abertura, atravessou o pano, à minha esquerda, junto ao Sr. Debrus, sentado atrás de mim, e pronunciou estas palavras: “Maria, Rosa”, e em seguida: “papá, mamã!” Tocou o Sr. Debrus, e o seu lindo braço roliço foi visto alongar-se por cima da sua e da minha cabeça. O Sr. e a Sra. Debrus ficaram convencidos de ter visto a aparição de sua própria filha, falecida em Valence, a 4 de novembro de 1902, a quem me referi em “O Problema do Ser, do Destino, e da Dor”. Em semelhante caso, nos pareceu impossível a simulação, pois que o médium jamais tinha visto a menina.
A autenticidade desses fenômenos é incontestável, por terem sido produzidos em excelentes condições de verificação. O mesmo já se não deu posteriormente. Logo que o médium se ocultava atrás das cortinas e fazia-se a obscuridade, ouviam-se ruídos significativos. No curso de 11 sessões a que assisti, pude adquirir a certeza de que o médium se despia, tirava os sapatos e pintava o rosto, para simular as aparições.
Numa das sessões, efetuada em casa da Sra. Nceggerath, à rua Milton, duas senhoras favoravelmente colocadas para bem observar, estando eu sentado mais distante, viram distintamente o médium despido, agachado e, depois, estendido no soalho, a erguer-se pouco a pouco para levantar a gaze flutuante que lhe servia para imitar os fantasmas. As aludidas senhoras, uma das quais era a Sra. Nceggerath, me comunicaram separadamente suas impressões, que concordavam, antes de conversarem acerca do fato observado.
No dia 9 de setembro, o Sr. Drubay, espírita íntegro e convicto, ao desmanchar o gabinete de materializações, no dia seguinte ao de uma sessão efetuada em sua casa, encontrou um retalho de filó de seda, muitíssimo fino, que parecia despregado ou arrancado de um pedaço maior. Dias depois, na sede da Sociedade de Estudos Psíquicos, no arrabalde de Saint-Martin, apanhou nas mesmas condições um trapo negro, muito comprido, fortemente impregnado de um cheiro de rosa e sândalo combinados, que se fazia sentir em certos momentos nas sessões e que o médium pretendia ser proveniente dos Espíritos. Mais de vinte testemunhas, em resumo, verificaram as fraudes, em sessões ulteriores.[ii] O compromisso formal que haviam tomado de observar o regulamento foi o que unicamente as impediu de desmascarar o culpado.
Tendo os “Annales des Sciences Psychiques” denunciado tais artifícios, julguei dever a meu turno intervir, para salvar as nossas responsabilidades e a de uma causa comprometida por essas divulgações,[iii] com o que pôde ficar o público inteirado de que os espíritas não se deixam ludibriar e sabem discernir a verdade da impostura. Denunciar, com efeito, as fraudes, onde quer que se produzam, é o meio mais seguro de fazer desacoroçoar os seus autores.
Procedendo como o fiz, desempenhei uma tarefa ingrata, mas necessária, que me valeu a aprovação das pessoas honestas. Se, de um lado, fui alvo de críticas malévolas, do outro recebi elevados e calorosos aplausos. Um eminente psiquista, que ocupa saliente posição na magistratura, escreve-me a tal respeito:
“Paris, 8 de abril de 1910.
Admirei vossa coragem no incidente M., porque adivinho quanto deveis ter sofrido, sendo obrigado a protestar.
Fizestes bem e vos revelastes mais uma vez o homem sincero e honrado que de fato sois. Sei que certos grupos ficaram um tanto descontentes convosco, mas cumpristes um dever, expelindo “os mercadores do templo”. O que lança o desprestígio no movimento de que sois um dos mais respeitáveis chefes é justamente a cegueira de certos grupos que, com a sua indiferença pela sinceridade dos fenômenos, favorecem os médiuns fraudulentos e os que se rejubilam com tais fraudes.
No que me diz pessoalmente respeito, estou convosco. Desde as primeiras sessões me foi patente a fraude de M., e compreendi facilmente os seus processos, que são grosseiros. Nada articulei publicamente, em atenção às pessoas que me acolhiam em sua casa, tendo-me, ao demais, M. prometido sessões sérias. Mas não cumpriu a promessa.”
Como epílogo desses fatos, os espíritas, reunidos no Congresso Internacional de Bruxelas, em maio de 1910, aprovaram a seguinte moção:
“O Congresso Espírita de Bruxelas, impressionado com as fraudes numerosas e repetidas que se têm produzido.nas sessões efetuadas, na obscuridade, por médiuns profissionais, impressionado com o prejuízo moral que assim causam à Doutrina:
Convida os grupos de estudos e os experimentadores que procuram os fatos de ordem física, os transportes e os fenômenos de materialização, a só admitirem sessões obscuras ou à meia-luz em condições de rigorosa verificação;
Recomenda especialmente, que sejam as mãos e os pés dos médiuns seguros por dois assistentes experimentados, enquanto durar a sessão, ou que seja isolado o médium por meio de um fio tenso e sem solução de continuidade; ou ainda, que seja ele metido numa jaula cuidadosamente fechada e cuja chave fique em poder de uma pessoa de confiança;
As sessões à meia-luz são muitíssimo preferíveis, por serem os fenômenos verificados por todos os assistentes. Com isso deve contentar-se um médium bem dotado, ao passo que se torna suspeito quando exige a obscuridade, embora esta aumente a força física, porque pode fazer recear que dela se aproveite para fraudar, o que tem ocorrido em certos casos. Cumpre satisfazer-se com resultados menores, porém mais seguros;
O Congresso dirige, além disso, uma instante exortação aos médiuns honestos e desinteressados. Pede-lhes que intensifiquem o zelo por bem servir uma verdade sagrada, verdade comprometida por desbriados simuladores, e lhes recorda que, se a fraude acarreta uma justa e severa reprovação, a dedicação e a sinceridade, ao contrário, lhes granjeiam a estima e o reconhecimento de todos, bem como a assistência das elevadas Inteligências invisíveis, que velam pelo progresso de nossas crenças neste mundo.”
Há – dissemos – fraudes inconscientes, que se explicam pela sugestão. Os médiuns são extremamente sensíveis à ação sugestiva, tanto dos vivos como dos desencarnados.[iv] O estado de espírito das pessoas que tomam parte nas experiências reage sobre eles e exerce uma influência que os médiuns não distinguem, mas que é às vezes considerável.
Médiuns perfeitamente honestos e desinteressados confessam que são impelidos à fraude, em certos meios, por uma força oculta. Na maior parte, resistem a tais sugestões, prefeririam renunciar ao exercício de suas faculdades a se deixarem arrastar por esse resvaladouro. Alguns cedem a essas influências; e um momento de fraqueza bastará para levantar dúvidas sobre todas as experiências em que houverem figurado.
Certas fraudes, verificadas com diversos médiuns, podem ser atribuídas a sugestões exteriores, quer humanas, quer espíritas. Às vezes coincidem e se combinam as duas influências. Os cépticos mal-intencionados são secundados por auxiliares do Além. E então o poder sugestivo será tanto mais irresistível quanto mais impressionável for o médium e estiver mais profundamente imerso no transe e insuficientemente protegido. Vê-se a que perigos está este exposto; em certas sessões, mal constituídas, mal dirigidas, pode tornar-se vítima das forças exteriores combinadas. Não era esse o caso do médium M., de que acabamos de falar e que consigo trazia o filó e os outros objetos necessários às simulações. A premeditação era nele evidente; os artifícios eram calculados, previamente preparados.
Acontece que o médium, principalmente o médium escrevente, se sugestiona a si mesmo e, num impulso automático, escreve comunicações que abusivamente atribui a Espíritos desencarnados. Essa auto-sugestão é uma espécie de indução do “ego” normal ao “ego” subconsciente, que não é um ser distinto, como vimos precedentemente, mas uma modalidade mais extensa da personalidade. Nesse caso, com a mais perfeita boa-fé, o médium responde a suas próprias perguntas; exterioriza seus pensamentos ocultos, seus próprios raciocínios, os produtos de uma vida psíquica mais intensa e profunda. Allan Kardec, Davis, Hudson Tuttle, Aksakof, etc., ocuparam-se em suas obras dessa categoria de médiuns, que o Sr. Delanne denomina “automatistas”. Diz ele: [v]
“O automatismo da escrita, o esquecimento imediato das idéias enunciadas, que incute no escrevente a ilusão de estar sob a influência de uma vontade estranha, a personificação das idéias, as noções que jazem na memória latente, as impressões sensoriais inconscientes, todos esses fatos se compreendem e têm sua explicação em causas reconhecidas no estudo mais completo da inteligência humana, e de modo algum supõem a necessidade de intervenção dos Espíritos.”
A credulidade ilimitada e a ausência de todo princípio elementar de verificação, que predominam em certos meios, favorecem e alimentam esses abusos. Há, em diversos países, grupos espíritas ingênuos, em que pseudomédiuns automáticos escrevem extensas elucubrações sob a inspiração de Santo Antônio de Pádua, de S. José, da Virgem. Ou ainda neles se incorporam Sócrates e Maomet, que em linguagem vulgar vêm declarar mil absurdos a ouvintes extasiados, proibindo-lhes ler e instruir-se, a fim de os subtrair a toda influência esclarecida, a toda averiguação séria.
Em tais meios, já não têm conta as mistificações. Conheci um jardineiro corajoso que, a conselho de um Espírito, ia cavar, à meia-noite, num sítio deserto, um enorme buraco, à procura de um imaginário tesouro. Uma senhora de 55 anos, muito devota, esposa de um oficial reformado, levava a ingenuidade a ponto de preparar o enxoval de uma criança que ela devia dar à luz, e que seria a reencarnação do Cristo – diziam seus instrutores invisíveis. Uns vêem por toda parte a intervenção dos Espíritos, até mesmo nos fatos mais triviais. Outros consultam os invisíveis sobre as menores particularidades da vida, sobre seus negócios comerciais e suas operações na Bolsa.
Atribuem-se geralmente essas aberrações a Espíritos embusteiros. Sem dúvida, as mistificações de além-túmulo são freqüentes; explicam-se facilmente pelo fato de se perguntarem muitas vezes aos Espíritos coisas que eles não podem ou não querem dizer. Fazem do Espiritismo um meio de adivinhação e atraem, com isso, Espíritos levianos. Não raro, porém, cabe à sugestão mental uma grande parte em tais embustes.
É por isso que no domínio arriscado, e tantas vezes obscuro, da experimentação, cumpre examinar, analisar as coisas com sereno critério e extrema circunspeção, e só admitir o que se apresenta com um caráter de autenticidade perfeitamente definido. O nosso conhecimento das condições da vida futura, como o próprio Espiritismo, assenta sobre os fenômenos mediúnicos. Convém estudar seriamente estes e eliminar inflexivelmente tudo o que não traga o cunho de uma origem extra-humana. É preciso não substituir, a pretexto de progresso, a incredulidade sistemática por uma cega confiança, por uma credulidade ridícula, mas separar com cuidado o real do fictício. Disso está dependendo o futuro do Espiritismo.
Abordemos agora uma questão extremamente delicada: a da mediunidade profissional. Pode a mediunidade ser retribuída? ou deve ser exercida com desinteresse absoluto?
Notemos antes de tudo que a faculdade mediúnica é, por natureza, variável, inconstante, intermitente. Não estando os Espíritos às ordens nem à mercê dos caprichos de ninguém, nunca se está de antemão seguro do resultado das sessões. Pode o médium estar indisposto, mal preparado, e a assistência mal composta, no ponto de vista psíquico. Por outro lado, a proteção dos Espíritos adiantados não se conforma de modo algum com esse fato do Espiritismo a preço fixado. Por isso, o médium profissional, aquele que se habituou a viver do produto das sessões, está exposto a muitas decepções. Como fará ele dinheiro de uma coisa cuja produção jamais é certa? Como satisfará os curiosos, quando os Espíritos não atenderem ao seu chamado? Não será tentado, mais dia menos dia, quando forem numerosos os assistentes e sedutora a perspectiva do ganho, a provocar fraudulentamente os fenômenos? Aquele que uma vez resvalou por esse declive dificilmente conseguirá voltar atrás. É levado a empregar habitualmente a fraude e cai pouco a pouco no mais desbragado charlatanismo.
Os delegados americanos ao Congresso Espírita de 1900, em Paris, entre outros, a Sra. Addi-Balou, declararam que mediunidade profissional e os embustes a que dá ensejo têm sido há alguns anos motivo de retrogradação e descrédito para o Espiritismo nos Estados Unidos. A melhor garantia de sinceridade que pode um médium oferecer é o desinteresse. É também o meio mais seguro de obter o auxílio do Alto.
Para conservar seu prestígio moral, para produzir frutos de verdade, deve a mediunidade ser praticada com elevação e desprendimento, sem o que se torna uma fonte de abusos, instrumento de contradição e desordem, de que se utilizarão as entidades malfazejas. O médium venal é como o mau sacerdote, que introduz no santuário suas paixões egoísticas e seus interesses materiais. A comparação não é destituída de propriedade, porque também a mediunidade é uma espécie de sacerdócio. Todo ser humano distinguido com esse dom deve preparar-se para fazer sacrifício de seu repouso, de seus interesses e mesmo de sua felicidade terrestre; mas, assim procedendo, obterá a satisfação de sua própria consciência e se aproximará de seus guias espirituais.
Mercadejar com a mediunidade é dispor de uma coisa de que se não é dono; é abusar da boa-vontade dos mortos, pô-los ao serviço de uma obra indigna deles e desviar o Espiritismo do seu fim providencial. É preferível para o médium procurar noutra parte os meios de subsistência e só consagrar às sessões o tempo que lhe ficar disponível. Com isso ganhará em estima e consideração.
Cumpre, todavia, reconhecer que médiuns públicos e remunerados têm prestado reais serviços. As pessoas que só dispõem de modestos recursos pecuniários nem sempre podem atender aos convites dos sábios, ausentar-se, empreender viagens, como o exige o interesse da causa que servem.
A esse respeito, Stainton Moses, que foi um experimentador consciencioso e um excelente juiz em tal matéria, diz o seguinte:[vi]
“Alguns dentre os médiuns públicos não vêem mais que os lucros a auferir e nem sempre recuam diante das fraudes para alcançar seus fins. Muitos há, entretanto, dos quais só se pode dizer bem e que são muitíssimo úteis. Nove vezes sobre dez, os que em tão grande número a eles se dirigem, incapazes de compreender e acompanhar uma experiência científica, unicamente exigem que em troca dos dez francos que pagam se lhes dê a prova da imortalidade. A multidão esgota rapidamente as faculdades do médium que, para não fazer fiasco, cede à tentação de recorrer à fraude. Apesar dessas detestáveis condições, fiquei muitas vezes admirado dos resultados obtidos e das magníficas provas fornecidas”
Que deduzir de tudo isso? É que haja uma justa medida, que o médium consciencioso, esclarecido acerca do valor de sua missão, pode facilmente observar. Se, em certos casos, é obrigado a aceitar uma indenização pelo tempo consumido e as excursões efetuadas, que o seja em limites de não comprometer sua dignidade neste mundo e sua situação no outro. O uso da mediunidade deve ser sempre um ato grave e religioso, isento de todo caráter mercantil, de tudo que a possa amesquinhar e deprimir


Léon Denis

No Invisível




[i]    O “Banner of Light”, de Boston, de 5 de agosto de 1899, anuncia ter-se descoberto a trama de uma vasta associação entre certos médiuns profissionais, para exploração do público espiritualista. Essa associação dirigiu a todos os médiuns daquela natureza uma circular, oferecendo uma série de aparelhos destinados a imitar as manifestações espíritas, com indicações dos preços, de 1 a 5 dólares”.
[ii]   Vide “Revue Spirite”, fevereiro e abril de 1900.
[iii]   “Annales des Sciences Psychiques”, dezembro de 1908.
[iv]   Essa ação já não é quase contestada nos círculos intelectuais superiores. “A ciência oficial – diz o professor Falcomer – ensina atualmente que um sensitivo pode enganar por sugestão mental proveniente de outrem.” (Phénoménographie”, pelo professor Falcomer.) Ver “Revue Spirite”, 1903, pág. 173.

[v]    Gabriel Delanne – “Investigações sobre a mediunidade”, pág. 185.
[vi]   Stainton Moses (aliás Oxon), “Spirit Identity”. “Revue Scientifique et Morale”, janeiro de 1900, pág. 397.