segunda-feira, 22 de julho de 2013

Desgraça real



        



                                              Capítulo: V 
Toda gente fala da desgraça, toda gente já a sentiu e julga conhecer-lhe o caráter múltiplo. Venho eu dizer-vos que quase toda a gente se engana e que a desgraça real não é, absolutamente, o que os homens, isto é, os desgraçados, o supõem.
Eles a veem na miséria, no fogão sem lume, no credor que ameaça no berço de que o anjo sorridente desapareceu, nas lágrimas, no féretro que se acompanha de cabeça descoberta e com o coração despedaçado, na angústia da traição, na desnudação do orgulho que deseja envolver-se em púrpura e mal oculta a sua nudez sob os andrajos da vaidade. A tudo isso e a muitas coisas mais se da o nome de desgraça, na linguagem humana.
Sim, é desgraça para os que só veem o presente, a verdadeira desgraça, porém, está nas consequências de um fato, mais do que no próprio fato. Dizei-me se um acontecimento, considerado ditoso na ocasião, mas que acarreta consequências funestas, não é, realmente, mais desgraçado do que outro que a princípio causa viva contrariedade e acaba produzindo o bem. Dizei-me se a tempestade que arranca as árvores, mas que saneia o ar, dissipando os miasmas insalubres que causariam a morte, não é antes uma felicidade do que uma infelicidade.
Para julgarmos de qualquer coisa, precisamos ver-lhe as consequências. Assim, para bem apreciamos o que, em realidade, é ditoso ou inditoso para o homem, precisamos transportar-nos para além desta vida, porque é la que as consequências se fazem sentir. Ora, tudo o que se chama infelicidade, segundo as acanhadas vistas humanas, cessa com a vida corporal e encontra a sua compensação na vida futura.
 Vou revelar-vos a infelicidade sob uma nova forma, sob a forma bela e florida que acolheis e desejais com todas as veras de vossas almas iludidas. A infelicidade é a alegria, é o prazer, é o túmulo, é a vã agitação, é a satisfação louca da vaidade, que fazem calar a consciência, que comprimem a ação do pensamento, que atordoam o homem com relação ao seu futuro. A infelicidade é o ópio do esquecimento que ardentemente procurais conseguir.
Esperai, vós que chorais! Tremei, vós que rides, pois que vosso corpo esta satisfeito! A Deus não se engana; não se foge ao destino; e as provações, credoras mais impiedosas do que a matilha que a miséria desencadeia, na agonia da verdadeira infelicidade, daquela que surpreende a alma amolentada pela indiferença e pelo egoísmo.
 Que, pois, o Espiritismo vos esclareça e recoloque, para vós, sob verdadeiros prismas, a verdade e o erro, tão singularmente deformados pela vossa cegueira! Agirão então como bravos soldados que, longe de fugirem ao perigo, preferem as lutas dos combates arriscados a paz que lhes não pode dar glórias, nem promoção! Que importa ao soldado perder na refrega armas, bagagens e uniforme, desde que saia vencedor e com glória? Que importa ao que tem fé no futuro deixar no campo de batalha da vida a riqueza e o manto de carne, contanto que sua alma entre gloriosa no reino celeste? ... Defina de Girardin. (Paris. 1861)
Allan Kardec: O Evangelho Segundo Espiritismo
 Federação Espírita Brasileira

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